quinta-feira, 15 de julho de 2010

Percurso(s)

Deixei, no post de 29 de Junho p.p.,  uma breve descrição das minhas actividades na Unidade Curricular de Médias Digitais e Socialização.do Mestrado em Comunicação Educacional Multimédia da Universidade Aberta, da responsabilidade da Professor Maria João Silva.

Quero aproveitar agora para explanar mais detalhadamente a incidência de cada uma das áreas no meu percurso formativo nesta unidade curricular.

Actividdade 1
NATIVOS DIGITAIS VS IMIGRANTES DIGITAIS Perfil do Estudante Digital

Os textos de Marc Prensky tem o seu quê de inovador e ao mesmo tempo de provocante. No entanto há outras achegas qe convém ter em linha de conta. Esta divisão nativo/imigrante digital é fruto de um contexto sócio-histórico muito específico e ocorre planetariamente a velocidades desiguais. Castells (2002) aduz algumas pistas interessantes para o enquadramento deste fenómeno. De acordo com este autor o acesso aos media digitais apresentam algumas carateristicas que fazem com que esta distinção tenha que ser aprofundada:

Primeira: diferenciação social e cultural que leva à segmentação dos utilizadores/espectadores/leitores/ouvintes […]. Como dizem alguns especialistas, no novo sistema “horário nobre é o meu horário”. A formação de comunidades virtuais é apenas uma das expressões dessa diferenciação.
Segunda: crescente estratificação social entre os utilizadores. […]. A informação sobre o que procurar e o conhecimento sobre como usar a mensagem serão essenciais para se conhecer verdadeiramente um sistema diferente dos mass media tradicionais. Assim, o mundo do multimédia será habitado por duas populações essencialmente distintas: a interactiva e a receptora da informação. […].

Terceira: a comunicação de todos os tipos de mensagens no mesmo sistema, ainda que este seja interactivo e selectivo (sem dúvida exactamente por isso), induz a uma integração de todas as mensagens num padrão cognitivo comum.
Esta perspectiva de diferenciação, estratificação e em simultâneo integração num padrão cognitivo comum tem o seu quê de inquietante, na medida em que pressupõe a existência de indivíduos que, mesmo sendo nativos na cultura digital, permanecerão vítimas de mecanismos de estratificação derivados fundamentalmente de deficits na literacia formal. A análise deste autor continua na mesma direcção:
A entrada da maioria das expressões culturais no sistema de comunicação integrado, baseado na produção, distribuição e intercâmbio de sinais electrónicos digitalizados, tem consequências importantes para as formas e processos sociais. Por um lado enfraquece de maneira considerável o poder simbólico dos emissores tradicionais fora do sistema, transmitindo por meio de hábitos sociais historicamente codificados: religião, moralidade, autoridade, valores tradicionais, ideologia política. Não que desapareçam, mas são enfraquecidos a menos que se recodifiquem no novo sistema, onde o seu poder é multiplicado pela materialização electrónica dos hábitos transmitidos espiritualmente: as redes de pregadores electrónicos e as redes fundamentalistas interactivas representam uma forma mais eficiente e penetrante de doutrina nas nossas sociedades do que a transmissão, por contacto directo, da distante autoridade carismática. No entanto,temos que admitir a coexistência terrena de mensagens transcendentais com a oferta de pornografia, novelas e grupos de conversação, dentro do mesmo sistema, os poderes espirituais superiores ainda conquistam almas, mas perdem o status de supra-humanos. O estágio final da secularização da sociedade prossegue, mesmo que às vezes assuma a forma paradoxal de um visível consumo religioso, sob todos os tipos de nomes genéricos e de marcas. As sociedades ficam verdadeira e finalmente desencantadas porque todos os milagres estão on-line e podem ser combinados em mundos de imagens autoconstruídas.
Por outro lado, o novo sistema de comunicação transforma radicalmente o espaço e o tempo, as dimensões fundamentais da vida humana. As localidades são despojadas do seu sentido cultural, histórico e geográfico e reintegram-se em redes funcionais ou então conjuntos de imagens, ocasionando um espaço de fluxos que substitui o espaço ele lugares. O tempo é apagado no novo sistema de comunicação já que passado, presente e futuro, podem ser programados para interagir entre si, na mesma mensagem. O espaço de fluxos e o tempo atemporal são as bases fundadoras de uma nova cultura, que transcende e inclui a diversidade dos sistemas de representação historicamente transmitidos: a cultura da virtualidade real, onde o faz-de-conta se vai tornando realidade.

Dados como os de um estudo sobre ritmos de leitura de leitores especializados, oriundos do mundo académico de  Hillesund (2010), parecem demonstrar que o hipertexto e o multimédia, para além de vantagens evidentes no acesso a determinados tipos de informação, não se prestam bem à leitura linear, “em profundidade”.


Actividade 2
IDENTIDADE SOCIAL NA ADOLESCÊNCIA, Discussão do Processo de Construção da Identidade na Adolescência

A problemática da identidade social na adolescência foi abordada a fundo, em grande medida sob a égide do pensador Erik Erikson, especialmente na vertente da sua construção, o conceito de crise, a relação com os pares, sentimentos...

No decurso do debate outras questões emergiram: privacidade, relações com os média, uso(s) da língua - SMS, abreviaturas, netspeaking, emoticons, chat.

No livro que citei no post de 18 de Abril de 2010, O Espião na Máquina de Café, os autores O’Hara, k. e Shadbolt, N., (2009) defendem a ideia de que o espaço privado do século XX terá de evoluir e que se valorizamos verdadeiramente a nossa privacidade teremos de desempenhar um papel muito mais activo em mantê-lo. As tecnologias que ameaçam também podem ser utilizadas para proteger e a consciencialização é um factor importante na implementação vantajosa das mesmas.

Dizem ainda os autores acerca dos sites sociais:

Todos os tipos de problemas relacionados com privacidade e segurança também são levantados pelos sites de redes sociais, como o MySpace, com os seus 100 milhões de utilizadores, o Friendster, que tem cerca de trinta milhões, o Classmates Online, com quarenta milhões e outros.  De um ponto de vista técnico, são uma extensão muito simples da metáfora de hoje da web. O desafio interessante é o de saber que todos estes pedaços de auto publicação e referências a outros indivíduos significam no seu todo. As pessoas que muitas vezes usam os seus verdadeiros nomes, publicam todo o tipo de informação sobre elas em sites sociais. Muitos deles são inofensivos, mas isto pode incluir detalhes de amigos, actividades, blogues que se lêem e por aí. A orientação sexual e crenças políticas e religiosas também estão muitas vezes presentes. Os jovens, em particular, cujo sentido de risco é de alguma forma mais pequeno e cujas vidas são de certa forma mais direccionadas para a farra do que as dos pais, podem acabar por dar demasiada informação. Algumas pessoas perderam o emprego ou lugares na escola depois de descreverem bebedeiras, consumo de drogas, ou experiências homossexuais.


Aproveitei para chamar a atenção dos colegas para Urie Bronfenbrenner (1917-2006), um autor que em sido de algum modo “redescoberto” nos últimos anos. Bronfenbrenner enfatiza a ideia de que o desenvolvimento humano tem que ser entendido dentro de um modelo ecológico capaz de integrar os diferentes contextos em que se processa. As profundas alterações nos conceitos de tempo e espaço que a cultura digital vém introduzindo na vida quotidiana, justificam a meu ver uma releitura deste autor.

Actividade 3
MEDIA DIGITAIS E CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE SOCIAL, Actividades Sociais e Desenvolvimento da Identidade nos Jovens

A síntese de um texto de Danah Boyd: Why Youth ♥ Social Network Sites: The Role of Networked Publics in Teenage Social Life, permitiu contactar com algumas ideias interessantes da autora sobre a relação entre os jovens e as redes sociais:

Os meios de comunicação online criaram um novo recanto para a juventude: a grande novidade da internet foi a possibilidade de os jovens participarem em públicos não regulados dentro de espaços físicos regulados por adultos (casa, escola...). Os pais tentam regular o comportamento dos jovens e estes tentam ocultar-se. Nas redes sociais, os jovens mostram como são, assumem riscos que os ajudarão a avaliar as fronteiras do mundo social, buscam no fundo acesso à sociedade adulta.

Dana Boyd organiza a sua pesquisa a partir dos sites sociais que oferecem a possibilidade da partilha de música (a música é, de acordo com esta autora, a cola cultural dos jovens). Onde a autora só vê vantagens, outros autores, como por exemplo Andrew Keen tem uma posição mais crítica. No seu livro “O Culto do Amadorismo”, com o sugestivo subtítulo “Como a Internet actual está a matar a nossa cultura e a assaltar a nossa economia”, publicado entre nós em 2008, Keen analisa o impacto que os média digitais tem na criação e distribuição cultural, nas suas declinações literárias e musicais:

Kevin Kelly, um utópico do Silicon Valley, pretende dar cabo do livro completamente – assim como dos direitos de propriedade intelectual de escritores e editoras. Com efeito, pretende reformular a própria definição de livro, digitalizando todos os livros num único hipertexto grátis, universal e em código aberto – como uma enorme Wlkípedía literária. Num «manifesto» publicado na edição de Maio de 2006 do New York Times, Kelly chama a isto a «Versão Líquida» do livro, uma biblio­teca universal em que ,cada livro é alvo de ligações cruzadas, aglome­rados, citações, excertos, indexações, análises, anotações, remisturas, remontagens, e em que o livro é entretecido ainda mais fundo na cultura do que nunca antes. Mais, a Kelly pouco importa que o colaborador desta utopia hipertextual seja Dostoievski ou um dos sete anões.
«Uma vez digitalizados» diz-nos Kelly, «os livros podem ser des­fiados em páginas únicas, ou ainda mais reduzidos, em fragmentos de página. Estes fragmentos serão alvo de remisturas e aglomerados em livros reordenados e estantes virtuais». É o equivalente digital a arran­car as páginas de todos os livros do mundo, rasgá-los linha a linha, e colá-los em infinitas combinações. Na opinião dele, tal resulta numa «rede de nomes e uma comunidade de ideias» . Na minha, prenuncia a morte da cultura.
[...]
A visão 2.0 de Kelly poderá ser o derradeiro terminal do nobre amador. Na sua versão do futuro, pode distribuir-se gratuitamente em linha a escrita individual. Os escritores deixam de receber direitos de autor pelo seu trabalho criativo, e terão de depender de discursos e de vender suplementos para ganhar a vida.
Resultado: escritores amadores e conteúdos amadores – tudo Drudge e nada de Dostoievski. Sem um modelo negocial de publica­ção viável, a biblioteca universal de Kelly degenera numa edição de autor universal – uma confusão hipertextual de lixo que não foi con­trolado e que é penoso de ler. As livrarias e as editoras desaparecem. Só nos restarão para ler as nossas próprias versões das nossas próprias histórias.
No negócio da música, há estrelas rock, como por exemplo Beck, que cantam a mesma cantiga que Kevin Kelly. Tal como Kelly e Jimmy Wales e os outros utópicos da Web 2.0, Beck embarcou na ideia da nobreza sedutora do amador. A grandiosa ideia de Beck con­siste em deixar os fãs criarem versões personalizadas da sua música  — deixando-os desenhar capas, escrever letras, criar misturas electróni­cas. Beck pretende substituir prontamente os artistas, compositores e engenheiros de som que trabalham para ele pelo entusiasta amador, disse-o à revista Wired:
Adorava lançar um álbum que se pudesse montar e misturar directamente no iTunes. Fizemos o projecto de uma remistura num sítio Web há uns anos, em que pusemos as faixas de uma canção e deixámos as pessoas fazerem as suas versões. Havia qualquer coisa de realmente inspirados na variedade e quali­dade da música com que contribuíram. Num mundo ideal, eu acharia maneira de deixar as pessoas interagirem verdadeira­mente com os discos que vou lançando – não somente remis­turar canções, mas também reproduzi-Ias como um jogo de vídeo."




Actividade 4
UTILIZAÇÃO SOCIAL DOS MEDIA DIGITAIS: A PERSPECTIVA DOS JOVENS, Entrevista a Jovens sobre a Utilização Social dos Media Digitais

A entrevista foi um momento muito interessante de trabalho de campo e permitiu o contacto com adolescentes ligados em maior ou menor grau a redes sociais. A construção do guião permitiu um nível elevado de interacção dentro do grupo e depois entre os diferentes grupos. No meu caso, apliquei-a a um jovem de 17 anos, guitarrista já profundamente envolvido nas áreas da composição de originais e de actuações ao vivo: usei um pequeno field recorder M-Audio MicroTrack II, transcrevi e disponibilizei o texto no forum criado para o efeito. O tratamento dos dados recolhidos dentro do grupo e algumas extrapolações (as possíveis dentro das circunstâncias decorrentes de uma amostra reduzida), foram disponibilizados aos colegas no prazo previsto.

A discussão assíncrona que se seguiu foi particularmente animada. para me situar na discussão deste tópico, retomei um texto de Ernest Greenwood, que é já um clássico na investigação em ciências sociais. A partir da distinção entre a metodologia experimental, de medida e de estudo de casos, Greenwood analisa cada uma das modalidades e conclui pela vantagem de aplicar, sempre que possível, mais que um método a cada situação:

Torna-se óbvio que a maneira como os defeitos e qualidades dos três métodos se encontram distribuídos é tal que cada um possui precisamente o que falha aos outros dois. Os três métodos deveriam considerar-se, assim, não como competitivos,mas como complementares; ou seja: deverão ser utilizados, quer sucessiva, quer simultaneamente.
[...]
Presentemente, impõe-se efectuar mais investigações que utilizem dois ou mais métodos ide investigação, suficientemente documentados para permitirem uma análise metodológica subsequente.


Bibliografia

Castells, M., (2002), A sociedade em rede, Fundação Calouste Gulbenkian, Lx

Greenwood, E.,(s/d) Tradução do artigo Los Métodos de Investigación Empíricaen Sociologia, publicado na Revista Mexicana de Sociologia, vol. XXV,nº 2, de Maio-Agosto 1963, pp. 541-574.Tradução de Maria de Fátima Sedas Nunes. Recuperado em 10 de Julho de 2010 de  http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1224164262K2lAE9wd1Ui39AM8.pdf

Keen, A., (2008), O Culto do Amadorismo, Ed.Guerra e Paz, Lx

Hillesund, T., (2010), Digital reading spaces: How expert readers handle books, the Web and electronic paper, in First Monday, Volume 15, Number 4 - 5 April 2010 recuperado em 10 de Julho de 2010 de  http://firstmonday.org/htbin/cgiwrap/bin/ojs/index.php/fm/article/viewArticle/2762/2504

O’Hara, k. e Shadbolt, N., (2009), O Espião na Máquina de Café, Plátano Editora, Lx.

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